O Mito do Sebastianismo

O Mito do Sebastianismo
De temperamento impetuoso, D. Sebastião (1554-1578), «O Desejado», subiu ao trono Português aos 14 anos. Com o sangue da juventude a ferver-lhe nas veias, tinha a ambição de reviver as glórias do passado heroico português, e estava determinado a conquistar prestígio militar e em beneficiar a burguesia mercantil com o comércio de ouro e açúcar provenientes do norte de África.

Impulsionado pelo desejo de ficar para a história como tendo conseguido algo grandioso, D. Sebastião começou a preparar a sua intervenção em Marrocos, investindo uma parte considerável da riqueza da coroa para construir o seu exército. Mas apesar de grande, o exército reunia homens inexperientes, pouco disciplinados e muito mal preparados. Ignorando os problemas da sucessão por se aventurar tão novo numa batalha sem garantir a sucessão do trono e apesar de todas as advertências, D. Sebastião partiu na dianteira, rumo a Alcácer Quibir, deparando-se com um inimigo bem preparado e muito superior em número. Perante um insucesso que nesse momento conseguiu adivinhar, e já esgotado pela fome e pelo cansaço, em poucas horas o exército português foi dizimado. O rei desaparecia então em combate, com apenas 24 anos. Esta derrota avassaladora depauperou ainda mais os cofres portugueses, fruto dos resgates exigidos para recuperar alguns nobres cavaleiros e culminou em terríveis consequências para o país, pois a morte do Rei ditou o início do fim da Dinastia de Avis e do período dourado da expansão marítima, e abriu as portas à crise dinástica que viria a colocar os reis de Espanha no trono português, durante os 60 anos que se seguiram.

Alcácer Quibir é, neste breve resumo, uma lição da história e um dejá vu para a indústria conserveira Portuguesa. Do empreendedorismo com que começaram muitos fabricantes, ou da mera oportunidade agarrada no momento certo, a indústria prosperou de braço dado com os pescadores da região onde se instalavam as fábricas de conservas, absorvendo boa parte da captura do pescado, em especial a sardinha portuguesa, desde sempre um dos peixes mais apreciados em conserva.

A ambição pelo poder e a perspetiva de crescimento, mesmo que desmesurado e inconsequente, poderiam abrir espaço à tentação do preço baixo da sardinha marroquina, deixando todo um setor nacional – o da pesca, abalado e numa espiral regressiva, arrastando inevitavelmente com ele as conservas, pela volatilidade dos preços da matéria prima, que sempre existe, qualquer que seja o mercado ou o setor.

Na Comur não pensamos assim. Como sempre na história, que é cíclica e onde tudo está escrito, pode-se aprender para o futuro, assim consigamos ter a astúcia para a entender e contextualizar. Ler o passado e saber valorizar o que temos e o que somos, de forma inovadora e criativa, é sempre uma batalha ganha. É essa a bandeira que a Comur hasteia, de mão no peito a cantar o hino com a sardinha portuguesa. Finalmente, o pensamento estratégico do setor está em transformação e este tem sido o caminho adotado por cada vez mais conserveiras: a aposta na qualidade em detrimento da quantidade. 

D. Sebastião está, alegadamente, sepultado no Mosteiro dos Jerónimos, mas a crença popular fez nascer o mito do Sebastianismo, na esperança de que regressaria um dia. O que foi tão desejado, afinal, nunca se concretizou – porque não foi preparado, não foi pensado. Foi um arrebatamento, um impulso. Mas a profecia estava lá, seguramente, em muitas histórias da história que lhe antecedeu. Como nas conservas.    
Mar 2020 | Portugal 2020
O Mundo Fantástico da Sardinha Portuguesa ©2023 all rights reserved

made by Anahory&Monteiro